6. Uma Nova Paixão

— Essa espuma branca é o que, hein? — perguntei fazendo careta.

— É leite, garota! — respondeu Suzy enfeitando o pires com um biscoitinho em formato de coração.

— Posso tomar só a espuma? — perguntei com gracejo.

— Nada disso! Eu fiz com o maior carinho. Na verdade eu pensei bastante em qual café fazer e cheguei a conclusão que um mocha seria simples e gostoso pra começar. — ela apontou para a xícara — Agora anda, prova...

Segurei a xícara pela alça e sujei meu buço de leite fingindo que estava dando um gole. Suzy estreitou os olhos ainda mais e eu dei um gole de verdade.

Senti um toque quente e cremoso em minha língua. O doce e o amargo se misturavam em uma completude perfeita. Não foi nem um pouco parecido com a primeira e única vez que tomei café.

— Esse negócio é docinho!

— Pois é e eu nem adicionei açúcar. — disse ela simulando uma expressão rígida.

— Vixe!... É muito bom! — disse eu esvaziando rapidamente a pequena xícara.

Suzy me olhava com um sorriso satisfeito.

— Gostou mesmo? De verdade? Eu posso fazer outro pra você. A gente tem tempo.

— Gostei de verdade! — respondi passando a língua no lábio superior.

Erguendo o seu pequeno nariz arrebitado, Suzy afastou os cabelos negros em corte chanel das bochechas sob as acentuadas maçãs do rosto. Seus olhos puxados se moviam de um lado para o outro enquanto ela parecia pensar em qual receita fazer.

— Já sei! — disse levantando o dedo para o alto — Vou fazer um Dalgona pra você com direito a gotas de chocolate.

Era meu quinto dia de trabalho e estávamos em nosso intervalo. No começo ela preparou alguns cafés mais elaborados, mas não demorou para nos entregarmos ao café espresso e foi aí que eu perdi a conta de quantas xícaras tomei.

Me alimentei de croissants, bolos e pães de queijo. Foi bom ter comido alguma coisa, pois eu nem imaginava que o excesso de cafeína poderia me afetar tanto quanto me afetou naquele dia. Cerca de uma hora depois comecei a sentir as consequências.

Minha colega devia estar acostumada ou talvez não tivesse tomado tanto quanto eu. Num dado momento ela me alertou para não exagerar, mas a essa altura eu já estava empolgada demais com o mundo para o qual havia sido transportada.

Eu estava pulando e rindo, enquanto segurava uma garrafa de água que Suzy me deu para aliviar os efeitos da cafeína. Nesse momento, Ulisses colocou a cabeça na sala reservada aos funcionários.

— O movimento tá aumentando.

Foi quando eu me dei conta de que havíamos passado da hora de intervalo.

— Já vou!... Javoujavoujavoujavou... Tenho que atender. Tenho que atender... — disse eu sentindo meu olho esquerdo tremer.

— O que houve com ela? — perguntou Ulisses para Suzy.

— Dei café pra ela experimentar e agora, que bom que a gente não tem tanque de café, se não eu acho que ela já tinha mergulhado...

— Pra quem não gostava, hein garota? — disse ele com o sorriso no canto da boca — Sabe com o que é que eu quero ver você mais empolgada ainda? — perguntou meu gerente.

— O que? — perguntei sentindo meu braço se mexer como se tivesse vida própria.

— Com o trabalho! Rumbora. — disse batendo palma para mim.

— Sim, sim, sim chefe! Você manda e eu obedeço! — eu disse batendo continência e correndo para a porta.

No salão principal, estava tocando Pela luz dos olhos teus de Vinicius de Moraes. Simulei que apoiava minha mão em um ombro imaginário e com a outra mão apertava a do parceiro de dança a minha frente. Juntos eu e meu cavalheiro de mentirinha, rodopiamos pelo salão principal. Girei, girei e girei até que esbarrei em um corpo grande e delgado.

— Opa! — disse uma voz grave e firme me segurando pelos cotovelos antes que eu pudesse me espatifar no chão com a força do impacto.

Esbugalhei ainda mais os olhos — que já estavam arregalados — quando fui abordada por um olhar profundo. Percebi que seus cílios eram de um castanho mais claro que os cabelos e as sobrancelhas. Percebi também que em meio ao verde de seus olhos haviam pequenos pontos dourados.

— Oooi filezinho! — apoiei as mãos em seus ombros, que ao contrário dos do meu parceiro de dança, eram de verdade. Firmes e quentes — Pensei que tu não fosse mais voltar, eu já tava com saudade...

O sorriso tímido surgiu no rosto de Pierre e eu senti minhas mãos tremendo um pouco mais. Quando, de repente, Ulisses se colocou na minha frente.

— Peço desculpas senhor, ela não está bem. — disse ele passando um braço sobre meus ombros e me levando de volta para a sala dos funcionários.

— Mais um espresso, por favor! — falei apontando um dedo para o alto.

— Cê tá louca, meu? Escuta aqui, quando você melhorar...

— Quando você melhorar!... — imitei engrossando minha própria voz e caindo na risada.

Logo parei apoiando a mão no peito quando senti meu coração dar um sobressalto estranho.

— Chefe, acho que eu tô infartando. — disse eu respirando fundo na tentativa de controlar os batimentos cardíacos.

Ulisses me deu um analgésico, água e me fez comer uma maçã que tinha na bolsa. Depois me colocou em um táxi para casa, mesmo com todos os meus protestos.

— Não precisa de tudo isso não. — falei sentindo um suor frio tomar meu pescoço.

— Precisa sim. Você vai pra casa e vai descansar — olhou para mim avaliando se eu estava bem — O efeito da cafeína não dura muito, você vai sobreviver.

— Eu não quero perder o dia de trabalho.

— Lis… Amanhã a gente conversa. — falou firme.

Ele me acompanhou até o táxi, pagou o motorista e deu instruções para que eu chegasse em casa segura. O meu comportamento no meu recente ambiente de trabalho ia de mal a pior desde o meu primeiro dia, me admirava muito por Ulisses ainda não ter me demitido.

Para piorar a situação, quando olhei pela janela do táxi percebi Laura cochichando ao ouvido de um dos funcionários enquanto olhava maliciosamente para mim.

Nunca pensei que pudesse ser tão odiada por aquela garota, ainda mais por motivos que só existiam na cabeça maluca dela.

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