3 - O inevitável

Dois dias depois, eu estava na academia do Instituto com Clara, estávamos colocando nossas roupas de caça.

 Como uma patricinha meio gótica que ela era, usava saias de couro pretas, supercurtas e soltinhas. Eu usava calça, também de couro preta, e o resto da roupa do mesmo material, com um colete vermelho, que mais parecia um corpete.

Amarrei meu cabelo em um rabo de cavalo e ela não precisou amarrar pois quase não tinha o que amarrar, de tanto que mudava o cabelo de cor e diminuía o tamanho. A arma dela era o arco—e—flecha ainda, ficou cada dia melhor com a pontaria e mais potente com o tiro. Eu usava a besta do papai, mas uma versão menor dela.

— As princesas já terminaram ou vão esperar até a lua cheia? — Ouvi a voz de Josh do outro lado da porta. Ele era o mais brincalhão de todos, e mais paciente, provavelmente Tyler o mandou dizer isso, já que gostava de manter sua máscara de “badboy” para todos. Mesmo a gente sabendo que ele não era. Apesar de eu ter uma cicatriz na perna hoje por causa dele.

Nós saímos e passamos por eles depressa.

— Uau! Se não fossem minhas irmãs eu…

— Josh! — Gritamos juntas em uníssono. — Eca!

Ele riu e passou na nossa frente. Nós o seguimos e demos um beijo no papai, como fazíamos todas as vezes, ele nos ungiu com o óleo, fazendo uma cruz em nossa testa. Papai sempre foi um homem religioso, ele achava que de alguma forma nos ungindo nós teríamos mais chances de voltar para casa. Eu cresci acreditando em Deus e indo a igreja, mas nisso eu não acreditava. Acho que o que nos fazia voltar éramos nós mesmos, era a inteligência e a sagacidade, se treinássemos muito, teríamos grandes resultados e mais chances de voltar pra casa vivos, um simples óleo não faria o nosso destino. Nós sim.

Clara e eu pegamos o carro dela, uma camionete preta, e Tyler e Josh pegaram o Porsche 911 de Josh, era um pouco exagerado, eu sei. Desnecessário, mas corria bastante.

Nós seguimos para o sul de Forest Lake, onde a alcateia foi vista pela última vez e onde aconteceu a última morte. Nunca nos separávamos em caça, assim como os lobos, nós quatro éramos mais fortes juntos, não importava quantos lobisomens tinham.

Lobisomens eram fortes, eles tinham o olfato aguçado, a audição, a visão. Eles corriam mais rápido, e eram definitivamente mais fortes, verdadeiros predadores. Mas tinham algumas desvantagens, além de poderem ser feridos por prata, eles também ficavam fracos perto de Wolfbless, um tipo de planta que eles tentaram fazer de tudo para destruir, mas havia uma tonelada delas plantadas no subsolo da minha casa, do instituto e nas casas de outros caçadores. Elas cresciam em uma estufa, escondida dos olhos dos predadores. Nós usávamos colares banhados nessa planta, os meninos usavam anéis, não paralisava os lobisomens, mas os queimava se encostassem então ficavam mais fracos e isso já ajudava. Era como uma kryptonita para o Superman.

Estacionamos os carros próximos a entrada estreita da floresta e caminhamos para dentro. Estava escuro, então usávamos óculos especiais, pois lanternas estavam fora de cogitação. Precisávamos nos aproximar com cuidado, para não chamar atenção, eles são preguiçosos, talvez os pegássemos desprevenidos.

— Eu não vejo a hora de ir beber. — Comentou Josh. — Espero que não demoremos muito para encontrá—los.

— Nunca demoramos. — Disse Clara. — Esses cachorros são bem previsíveis. Aposto que estão acasalando na beira do rio com as fêmeas.

— Nossa, Clara… — murmurei.

— O que? Você acha que eles não acasalam? — Perguntou ela.

— Eu não… penso muito sobre isso, tipo, nunca. — Respondi.

— Eu penso. Imagina como deve ser selvagem essa coisa toda.

— Você é doente… — Passei na frente dela e acompanhei Tyler. Ele sempre ficava calado, só falava quando necessário. E ficou pior depois do tiro que ele me deu na perna, ele nem olhava mais na minha cara, não sei se foi culpa, ou raiva por sua irmãzinha namorar um lobisomem.

Um barulho de galho despertou meus ouvidos, sem falar eu fiz um sinal para todos e segui para a esquerda, de onde o barulho tinha vindo. Andamos por cinco minutos e não encontramos nada, estávamos sendo atraídos, se era o que eles queriam, nós daríamos, continuamos em frente.

— Talvez, se Clara fosse lá e seduzisse o Alfa, nós o pegássemos. — Ironizou Josh. Eu ouvi ela dar um tapa forte em seu peito e fazê—lo tossir.

Eu ri e os mandei ele calar a boca, mas não sem antes deixá—la com mais raiva.

— Pode apostar Josh, o Alfa com certeza adoraria fazer sexo selvagem com ela. Ou… Acasalar, como ela disse.

— Pelo menos eu faço sexo com alguém. — Se doeu ela. — E você, está sem transar a quanto tempo? Dois anos?

— Um ano, e estou muito bem com isso, não é que eu vá morrer por não ter um orgasmo com um homem, ou coisa parecida. — Respondi. — Posso fazer isso sozinha.

— Oh, por favor… Não quero ouvir sobre a vida sexual da minha lobinha. — resmungou Josh.

O último homem que eu fiquei foi Joe, com quem eu quase casei, mas como ele deu em cima da minha irmã, eu o coloquei para correr, e desde então, só estudei e cacei.

— Ah, claro, a puritana… — disse Clara se referindo a mim.

— Já percebeu que quando Josh começa uma coisa, ele sempre para pra ver o circo pegar fogo? — Eu disse. — Deveríamos estar falando das prostitutas que ele pega, e não da minha vida sexual não ativa.

— Ele é um idiota. — ela deu outro tapa nele o fazendo rir.

— Se os três idiotas puderem calar a boca, as bestas estão ouvindo tudo que dizem. — Explodiu Tyler em um tom baixo e sério.

— Desculpe. — Dissemos os três juntos como uma melodia.

Depois de andar muito, chegamos até uma parte da floresta onde as árvores estavam cortadas, e só haviam troncos secos. Senti o calor conhecido, lobos se aproximavam.

Alguns deles atacavam em forma de lobos, pois assim ficavam mais rápidos e mais fortes. Eles eram grandes e assustadores, mas nada com que meus irmãos e eu precisássemos nos preocupar. Se estivéssemos armados, nada temeríamos.

Eu tinha um certo sensor para lobos, que eu não entendia. Mas ajudava bastante.

— Olá meninos, venham brincar. — Disse Clara, em um tom sexy, sabendo que até o que estivesse mais distante a ouviria. — Temos carne fresca para vocês, vira—latas, e uma delas é quase imaculada. — ela colocou uma flecha em seu arco e puxou pra trás.

— Você é tão estúpida, sabia disso? — Perguntei.

Ela deu um beijo no ar e uma leve piscadela pra mim, e mirou seu arco pronto para atirar.

Nós vimos pelas sombras das árvores, cerca de dez pessoas, a maioria era homem, mas haviam algumas mulheres também, que eu tenho certeza que Clara quereria pegá—las primeiro.

A lenda dizia que se matássemos o Alfa, a ninhada morreria sem nenhum esforço. Meu pai havia provado isso várias vezes, então precisávamos chegar até o Alfa logo. Os olhares raivosos e amarelos nos encaravam, mas não podíamos atacar primeiro, então esperamos.

Eles se aproximaram mais um pouco. Eu já estava começando a sentir a adrenalina no meu corpo. Com certeza eu tinha uma trilha sonora pra este momento, e era qualquer uma da Ac/Dc.

— Onde está o Alfa? — Perguntei para a alcateia.

Vi sorrisos se formarem em seus rostos, e então vi alguns homens se afastarem e abrirem o caminho. Esse seria fácil, muitas vezes o Alfa não lutava junto da alcateia, sempre se escondendo pelas sombras de seus “filhos”, mas esse parecia querer lutar, e nós acabaríamos com ele, assim como acabamos com todos os outros.

Foi aí que eu vi, um homem alto, forte, de cabelos castanhos, com uma barba por fazer, de mais ou menos quatro dias, os olhos de Alfa vermelhos com veias laranjas se movimentando ao redor. Minha pele, meu coração, minha expressão, eu, congelei. E a música do AC/DC que tocava na minha cabeça ficou muda, assim como qualquer barulho que estivesse por perto. Eu me sentia fraca e impotente, poderia cair de joelhos a qualquer momento e nem fui atingida, minha respiração ficou ofegante e meu coração acelerou, minha boca se abriu em um pequeno "O", atônita, enquanto o sorriso meia boca do Alfa estampava o rosto dele, parecia satisfeito e parecia querer sangue derramado. Eu pisquei várias vezes, tirei os óculos noturnos e apertei meus olhos com força, mas logo percebi, não era sonho, não era ilusão, era real, e quem eu estava vendo na minha frente, somente há alguns metros de distância, era Chuck, vivo, em pé, ele era o Alfa. Porra. Que diabos?

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