Capítulo 2

Os Abusos

Por mais que eu não soubesse o que significava depressão eu já carregava essa doença, só depois de adulta aprendendo mais sobre isso, pesquisando, assistindo os noticiários, percebi que eu sofrera abuso, e que, precisava de ajuda para superar esse trauma, e após ser diagnosticada com Depressão Maior, que é a mais severa, eu passei a entender tudo mais profundamente.

Eu tinha sintomas que hoje sei que era típico da depressão, mas, não tinha apoio, ninguém em minha casa sabia lidar com isso, e muitas vezes que desmaiava eu era criticada por minhas irmãs, dizendo que estava com frescura.

Eu sempre fui uma menina doce, silenciosa, tímida enfim muito quieta, observava meu pai, surrando minhas irmãs com pedaço de pau, pedaços de borracha, eu me mantinha num canto, tremia de medo, não queria sofrer como minhas irmãs, e sempre fazia o possível para que ele não ficasse nervoso, para não sobrar para mim.

Realmente não tenho muitas lembranças boas da minha infância, daquelas que você chupa um pirulito ou um picolé e te dá um DéJàvu, sabe, as únicas recordações que tenho me assusta, por isso meu próprio subconsciente eliminou a maioria delas, eu só sinto uma escuridão nas minhas recordações e em alguns ‘flashes’ me lembro do que aconteceu em alguns momentos tristes da minha vida.

Com seis anos comecei a ir para escola, não me lembro como aprendi, mas já sabia escrever e ler.

Já na escola comecei a sofrer sem saber, tinha um grupo com quatro meninas que não admitia minhas boas notas, porque eu era muito tímida, eu não falava com ninguém, não participava de atividades em grupo, não fazia educação física, enfim, só ficava num canto da escola, só copiava da lousa e fazia os exercícios nos cadernos, minhas professoras gostavam de mim por eu ser quietinha e fazer todos os exercícios direitinho e isso irritava o grupinho.

Então, elas se juntavam para me atormentar, me tomava o único lanche que levava para escola, e eu ficava com fome, pois não tinha coragem de contar a professora nem para minha mãe, elas tomavam meu lápis e borracha dizendo “agora quero ver se a mudinha vai fazer seus exercícios, senhora sabe tudo”, eu ficava em silêncio, só guardava no peito com muita dor, não esperava apoio da minha mãe, pois, na minha casa não existia laço fraterno, era do tipo, dá comida para não morrer de fome e dar banho, não existia amor fraternal, na maioria das vezes que tivesse diálogo era para brigar ou dar bronca, eu não me recordo de um abraço ou um beijo de mãe, ou pai.

Aos meus oito anos, acordei de madrugada assustada, fui dormir no quarto do meu irmão de cinco anos porque minhas irmãs mais velhas saíra para casa das amigas e minha mãe ficou com pena de deixar eu dormir sozinha no quarto, até porque eu tinha pesadelos com frequência e sempre acordava chorando, porém, esse dia foi mais assustador que qualquer um de meus pesadelos, comecei a mexer as pernas, e comecei a sentir um incomodo, uma mão as seguravam para mantê-las abertas senti uma mão enorme massageando minhas partes íntimas quando abri os olhos ele (pai) estava com seus olhos arregalados e com uma respiração ofegante, o nariz mais aberto, pois era assim que ficava quando ele estava ofegante, não consegui gritar, senti como num pesadelo, porém pior, pois era real, não sabia o que era tudo aquilo, pois meus pais eram conservadores demais, a palavra sexo era proibido na nossa frente, e quando digo "nossa" é uma família de cinco irmãs e um irmão que era o caçula, não sei se meu pai fizera a mesma coisa com minhas irmãs, eu era a mais nova, mas isso não me levou a questionar nenhuma delas, pois, como não entendia a gravidade da situação, então fingia que era normal e esquecia. Tive medo de compartilhar com alguém sobre isso, nem com minha mãe não tive coragem de me abrir, pois, ela sempre o apoiava, não sei, talvez também tivesse medo dele. Por causa dessa situação triste e confrangedora, eu não dormia mais em paz, meus pesadelos aumentaram e eram mais assustadores todas as noites e acordava nas madrugadas gritando, minha mãe sem saber de nada, orava a noite inteira ao lado de minha cama.

Um dia pedi para meus pais colocarem uma tranca na porta do meu quarto por medo, quiseram saber porque, mas, disse que só queria privacidade, minha mãe relutou, pois, se preocupava com meus pesadelos, mesmo assim os convenci, dizia que não era mais uma criança e precisava de privacidade.

Depois de algum tempo sem ele mexer comigo, comecei a me tranquilizar, porém, meus pesadelos continuaram, eu tinha pesadelos diariamente, mal dormia, pois, sempre acordava chorando. Estava uma tarde escura já depois de o sol se pôr, e estávamos trabalhando, pois, eu era obrigada a ajudar na roça e nas construções, para não sofrer os castigos, e nesse dia estávamos fazendo adobe (blocos de barro), eu e ele trabalhando atrás da casa a sós, então ele me chamou, logo tomei um susto, ele estava com o órgão genital de fora e ereto, eu não sabia que diferença isso fazia na época, pensei que fosse normal estar daquele jeito.

Tive medo, quis fugir, ele ficou tentando me acalmar e dizia “Isso é normal, venha, passe a mão, só para você sentir. ”

Quis me enfiar debaixo da terra, tinha muita vergonha... não sei o que deu em mim, talvez por medo, encostei a mão naquilo e depois saí correndo, não esqueci nunca mais aquela cena, a sensação daquele membro, duro e quente eram agora meus piores pesadelos.

Minhas noites era puro terror, meus pesadelos eram frequentes com bonecos andando pelo meu quarto e me ameaçando com palavras cruéis do tipo; "Não conte nada que aconteceu para ninguém, senão você morre" e dava aquele sorriso aterrorizante jogando todas as minhas roupas do guarda-roupa no chão, nessa hora eu acordava gritando.

Para tomar banho ou dormir, depois disso era uma tarefa difícil, tentava ficar sem tomar banho, porém morava na roça, era muita terra e muito suor.

Por isso era sempre um banho rápido, e sonos leves. Tinha muito medo, adquiri medo de tudo e de todos e ninguém se incomodava com isso, nem mesmo questionava nada em minha vida, meus tormentos eram somente meus comigo mesma.

O telhado do banheiro da minha casa estava com uma telha quebrada por isso, ficava um buraco, um dia enquanto eu tomava banho ouvi uma pedrinha caindo e olhei para cima, e vi ali naquele buraco, aqueles olhos assustadores me espiando tomar banho, era meu pai, me enrolei depressa na toalha e ele desceu depressa da escada também, quando sai do banheiro a escada não estava mais lá, corri e falei

— Mãe, pai estava me espiando pelo buraco do telhado.

Ele logo gritou, se defendendo “Larga de bobagem menina, eu estava arrumando o buraco do telhado”.

Em quem minha mãe acreditou? Nele, parecia óbvio, ela jamais iria acreditar que ele tivesse mostrado seu membro para uma garotinha de nove anos, ela jamais acreditaria que ele tivesse passado no quarto e metido seus dedos nojentos dentro de mim. Então no fim, tudo ficava por isso mesmo.

Ele já fora degredado por meter a mão nos seios de uma garota da escola, ela fez um escândalo e contou para mãe dela que veio tirar satisfações, mas, minha mãe? Não sei se estava cega ou tivesse medo dele, ou medo de o perder, só sei que ela sempre se comprometia ficando do lado dele. Ela é uma grande mulher, muito conservadora, não gosta de escândalos e sempre dizia, eu jamais vou me separar do seu pai, pois nós juramos ficar juntos até que a morte nos separe.

Então eles continuarão juntos, até que a morte os separe.

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