Capítulo 4 - Despedida

Eu fiquei horas no hospital, esperando para poder ver meu primo.

Meus tios estavam preocupadíssimos, mas eu sabia que ele ficaria bem.

Dois dos homens que haviam invadido a nossa casa também foram levados para o hospital, mas seriam presos assim que se recuperassem e o outro estava morto.

Dei meu depoimento aos policiais e tive medo de que eu seria presa também, ou no mínimo julgada, mas Marcelo me garantiu que eu não precisava me preocupar, pois eu havia apenas me defendido e tudo já estava resolvido.

Quando os médicos finalmente nos deixaram entrar para vê-lo fiquei surpresa que ele parecesse ainda melhor do que eu esperava.

Felipe estava sentado na maca, e apesar de estar com o cabelo todo bagunçado, ele me parecia ótimo, apenas com o ombro enfaixado.

Tive vontade de socá-lo por ele ter sido tão descuidado, mas no fundo eu estava grata, afinal ele salvou a minha vida.

Meus tios o abraçaram e eu ri da careta de dor que ele fez, então logo depois que eles o soltaram eu o abracei também.

- Por que você fez isso, seu idiota? Você levou um tiro por mim.

- Eu estou bem. Não podia ter deixado que atirassem em você.

Sorri para ele, e pela primeira vez percebi que a gente não se odiava tanto assim.

Bom, estávamos sempre brigando, mas lá no fundo éramos como irmãos e sempre fazíamos as pazes.

- O médico disse que você só voltará para casa amanhã. - disse meu tio antes de lançar um olhar de canto de olho para mim.

- Precisamos falar sobre algo antes. - continuou minha tia.

- Nós vamos nos mudar, não é? - perguntou Felipe.

Meu tio confirmou com um aceno de cabeça antes de olhar para mim.

- Precisamos nos mudar o mais rápido possível.

- Mas vamos continuar na cidade, não é? Ainda falta uma semana para terminar as aulas e o Mateus...

- Sinto muito querida. - lamentou minha tia - Aqueles homens sabiam sobre você. Não podemos continuar na cidade. Temos que ir o mais longe possível.

Aquela notícia me chocou, mas algo nas palavras de minha tia me incomodou.

- Como assim "sabiam sobre mim"? - perguntei.

- É complicado. - respondeu meu tio.

- Não importa se é complicado. Se é sobre mim, então eu preciso saber. O que eles queriam comigo?

- Vamos falar sobre isso depois. - meu tio decidiu - Hoje precisamos passar em casa para arrumar nossas malas. Passaremos a noite em um hotel e, se tudo der certo, amanhã começaremos a nossa viagem.

Felipe acenou com a cabeça.

Eu estava chateada, pois não queria ir embora e queria receber uma explicação para tudo aquilo.

Voltei para casa triste, entrei no meu quarto e olhei em volta. Eu ia sentir saudade daquele lugar, porém entrar de novo naquela casa, depois de tudo o que havia acontecido ali, me causava calafrios.

- Alice, arrume as suas coisas. - disse meu tio ao entregar uma mala grande para mim - apenas o mais necessário.

Acenei com a cabeça e peguei a mala.

- Sua tia já conseguiu uma casa para nós alugarmos e aonde nós vamos não falam a nossa língua, mas você não terá que se preocupar com isso, pois não sairá de casa, nem sozinha, nem acompanhada. Estamos entendidos?

- Sim. - eu concordei cabisbaixa.

- Certo. Isso será para a sua segurança. Vou deixar você e sua tia no hotel e vou ir atrás de documentos falsos para a nossa viagem. Se algo acontecer ligue para a polícia ou para mim imediatamente. Não abra a porta, nem atenda telefone e deixe as portas e janelas trancadas até eu voltar. Amanhã vamos buscar Felipe no hospital e vamos pegar um avião. Entendeu tudo?

- Sim, tio.

- Então repita.

Soltei um suspiro.

- Você vai nos deixar em um hotel e eu preciso deixar tudo trancado e não posso atender a porta nem o telefone. Se algo acontecer devo ligar para você ou para a policia. Vamos pegar um avião amanhã para um lugar onde não falam a nossa língua, mas eu vou ficar trancada dentro de casa.

- É para a sua segurança, Alice... - ele disse, me olhando nos olhos.

- Mas tio... Por que estão atrás de mim?

- Eu vou te contar isso quando tivermos mais tempo, está bem? - ele pediu - É um assunto delicado e difícil de explicar.

- Está bem... - suspirei derrotada.

Eu estava curiosa e queria que ele me dissesse logo, mas saber que ele pretendia me contar já era alguma coisa.

- Apenas o necessário. - ele repetiu apontando para a mala e me deixando sozinha novamente.

Lentamente comecei a tirar as roupas do guarda-roupa e coloca-las na mala, deixando algumas delas para trás.

Dos meus pertences pessoais eu só peguei o básico, e também peguei o meu álbum de fotografias preferido, os outros eu deixei porque possuía todas aquelas fotos digitalizadas e salvas no meu celular, sem contar que eles ocupariam muito espaço.

Olhei para os meus ursinhos de pelúcia - sim, eu tinha ursinhos de pelúcia - e suspirei. Eu queria levá-los, mas eu tinha certeza de que aquilo não se encaixava em "necessário" para o meu tio, então peguei apenas um deles, o meu preferido. Minha tia havia falado que eles o trouxeram da casa dos meus pais quando eu era bebê. Era um ursinho branco deitado em um travesseiro azul. Ele usava uma toquinha e um pijama com desenhos de estrelas que brilhavam no escuro. Abracei ele com força antes de colocá-lo junto com as roupas.

Olhei para os meus livros na prateleira e soltei outro suspiro. Era difícil deixar as coisas de que eu mais gostava para trás, mas eu não poderia levar tudo, e escolher um livro seria uma tarefa impossível, então não levei nenhum, ao invés disso eu os coloquei em uma sacola grande e os deixei perto da porta. Se eu não iria ficar com eles, eu os daria para outra pessoa.

Me sentei na cama e me permiti chorar.

Eu não sabia o porquê de tudo aquilo, mas eu não queria ir embora dali.

Respirei fundo e tentei ser forte.

Mandei uma mensagem para Mateus, pois queria vê-lo uma ultima vez antes de partir.

Poucos minutos depois eu ouvi algumas batidas na porta do meu quarto.

- Alice, seu namorado está aqui. - ouvi meu tio falar, com certo desprezo na palavra "namorado".

Fui correndo até a sala, onde ele estava sentado no sofá, parecendo preocupado.

Eu o abracei com força e chorei em seu ombro.

- O que foi Alice? Aconteceu alguma coisa?

Me afastei um pouco dele e sequei as lágrimas antes de falar.

- Eu vou embora. Vou me mudar daqui. Meu tio não disse para onde vamos, mas será bem longe.

Mateus ficou me encarando, como se esperasse que eu fosse dizer que aquilo era uma brincadeira, mas ele sabia que não era.

- Você... Isso quer dizer que... a gente não vai mais se ver?

Assenti com a cabeça.

- Então... você está terminando comigo?

Mateus parecia preocupado ao olhar para mim, esperando por minha resposta.

- Eu não quero terminar com você. - respondi - mas não sei se um relacionamento a distância vai funcionar.

Ele suspirou e olhou para o chão.

- Eu só... Não estou terminando com você. Acho que a gente pode tentar. Quem sabe depois eu não volte, ou sei lá...

Ele olhou para mim e me puxou para um beijo.

- A gente vai dar um jeito. - disse ele.

Sorri, com esperança pela primeira vez.

- Quero que fique com uma coisa pra mim.

- O que?

- Meus livros. Eu não vou poder leva-los, então quero que fique com eles.

Ele sorriu para mim e assentiu com a cabeça, concordando.

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