Lados opostos

   Era uma noite bonita, o céu estrelado era admirado pelas pessoas do reino que saíam de suas casas para observar a grandeza do magnifico céu. Tudo estava calmo e tranquilo, menos dentro do palácio, onde Alina, a nova rainha, sentia dores fortes indicando que seu primeiro filho iria nascer. Preocupada ao sentir dores insuportáveis, a rainha foi levada até sua cama, enquanto outras servas pegavam panos e uma bacia com água. Os lençóis da cama eram agarrados com força pelas mãos delicadas da rainha, que ali sentia o peso da responsabilidade de estar dando à luz o próximo herdeiro do trono.

   Suas damas estavam ao seu lado a auxiliando e tentando acalmá-la, torcendo que a mãe e a criança ficassem bem, enquanto o rei Atter andava nervoso por dentro do salão real. A janela parecia um bom lugar para tentar respirar um pouco tentando fazer com que seu medo passasse, mas a novidade de ser pai estava presa nele. Como ele se sairia? Será que seria um filho homem? Atter estava nervoso ao pensar em como seria sua personalidade, pois, ele não poderia falhar ao ensinar seu filho.

   – Está demorando, não é? – Ater perguntou se virando da janela enquanto esfregava suas mãos.

   – É um trabalho demorado, temos de ter paciência, além disso, tenho certeza de que o rei será grandiosamente recompensado por isso. – Disse o novo comandante do exército de ABAD, Axel.

   Atter e Axel tinham uma forte amizade e, ambos imaginavam como seria se as coisas fossem diferentes. Por sorte e por demonstrar bravura diante dos antigos reis, os amigos foram reconhecidos e, hoje haviam se tornado o grande rei, e o comandante do exército.

   Depois de muito esforço, uma criança linda e saudável nasceu no palácio. Era uma graciosa menina que chorava alto no colo da parteira, enquanto a mãe pedia para finalmente tê-la em seus braços. A emoção de ser mãe era um misto de felicidade extrema e responsabilidade de agora em diante, porém, Alina notou que algo estava acontecendo, e aquela alegria toda se transformou em uma terrível dúvida e medo ao ver a expressão preocupada da mulher que segurava sua filha no colo.

   – O que houve? O que está acontecendo? – Alina repetiu nervosa tentando se levantar da cama em vão.

   A parteira ficou receosa ao responder o que tinha visto, e preferindo que sua rainha mesma descobrisse, ela entregou a criança à mãe, colocando a mão em frente à boca, triste.

   Ao pegar sua filha no colo, sentiu lágrimas escorrerem pelo seu rosto, pedindo para estar apenas sonhando. Há algum tempo atrás seu medo era que o irmão de seu marido voltasse ao palácio para atentar contra sua vida, ou a do bebê, ou até mesmo de seu marido, mas agora sua querida filha, de acordo com o decreto feito pelos antigos reis, estava condenada à morte.

   Atter abriu as portas do quarto com um sorriso enorme ao ouvir o choro da criança pelo lado de fora, se aproximando da cama onde sua mulher estava. Entretanto, quando notou o rosto angustiado de sua esposa, sua atenção foi diretamente para o bebê, notando pequenos fios de cabelo brancos. A primeira coisa que veio em sua mente foi o julgamento do povo de ABAD sobre Adelly, que possuía uma mecha de cabelo branco, tal coisa que para todos significava que a mulher era algum tipo de feiticeira. Principalmente depois que Adiná, mãe de Adelly faleceu por ter sido envenenada, de acordo com ela. As pessoas pediram sua morte, mas a antiga rainha interviu fazendo com que ela fosse exilada, e seu marido assinou o decreto de que todos que nascessem com tal mecha deveriam ser mortos, pois isso provaria que quem possuísse não era alguém comum.

   Alina não acreditava nessa história, sabia que a mecha não significava nada, mas para seu povo as coisas eram bem diferentes. Além disso, no fundo queria acreditar que Adelly era uma pessoa boa e que seu cabelo e a morte de sua mãe foram apenas coincidências e que nada era sua culpa. Porém Atter acreditava que Adelly não era alguém confiável, por isso seu irmão havia se envolvido com ela. E agora sua própria filha tinha por destino a morte por causa de Adelly?

   – Meu amor... – Ele suspirou segurando firme suas lágrimas, pois queria se mostrar forte diante daquela situação.

   – O que faremos Atter? – Perguntou a rainha deixando que as lágrimas caíssem enquanto amamentava sua filha.

   Atter levantou o rosto respirando fundo, enquanto pensava em alguma solução. Ele não poderia desmanchar o decreto agora que sua filha nasceu, pois quando o povo soubesse disso, iriam achar que a garota poderia crescer e se tornar alguém pior do que Abnorú, ainda mais por acreditarem que ela seria uma feiticeira. Atter então se levantou pegando sua filha no colo, a erguendo convicto de que não deixaria nada nem ninguém fazer mal a ela, nem à sua família. Ele iria dar um jeito.

   – Esta bela menina, a minha filha, está destinada a grandes coisas, eu sei disto. Seu nome será Ariana, e será forte e delicada como uma flor do deserto. Ela viverá dentro do palácio e não sairá daqui, nem será vista por alguém fora deste castelo, até que nós decidamos o que fazer. Eu cuidarei para que Ariana seja uma menina inteligente, e muito bem dotada, e ela será uma grandiosa rainha, independente se tivermos outro filho no futuro.

   Alina sorriu se apegando às palavras do marido, confiando que eles fariam de tudo para que sua filha ficasse em segurança.

   Mais tarde naquela noite, durante a madrugada, a rainha descansava ao lado de seu marido, até começar a se mexer balbuciando algumas palavras, por fim, se acordando assustada. Seu coração batia rapidamente e na tentativa de acalmá-lo, Alina colocou sua mão no peito, enquanto olhava o berço de sua filha ao lado da cama.

   – O que foi querida? – Atter perguntou vendo Alina tentando se recuperar de um possível sonho ruim.

   – Tive um pesadelo... Mas já passou, está tudo bem. – Ela disse optando por não contar o que viu no sonho. Atter tinha muitas preocupações e, como ele disse mais cedo, ele não deixaria nada de ruim acontecer com sua família.

   – Tem certeza? Você deve estar cansada pelo esforço que fez mais cedo. E eu sei que não esperávamos pelo que aconteceu, mas, temos que ser corajosos, nossa filha precisará de nós. E eu vou cuidar de vocês, eu prometo. – Disse Atter passando seus dedos pelo delicado e meigo rosto de sua amada esposa no intuito de fazê-la ficar calma.

   Alina sorriu se deitando nos braços de seu esposo tendo certeza de que ele tinha razão, ninguém, nem mesmo Abnorú, faria mal a eles, como ela havia sonhado.

   No outro lado do reino ABAD, depois da montanha, onde ficavam as pessoas expulsas dos portões do castelo, vivia agora Abnorú e sua mulher, Adelly. Depois que descobriu que Abnorú havia sido expulso do palácio, obrigado a viver fora dos portões e das muralhas que cercavam a cidade, a vila e o castelo, Adelly o seguiu sabendo que o homem não ia deixar as coisas como estavam. Ele com certeza tinha um plano para voltar e governar gloriosamente, e ela não perderia a chance de se tornar a grande rainha do maior reino da terra. Ainda mais dizendo esperar um filho do homem. Abnorú não a abandonaria grávida, ela acreditava.

   No Vale da Escuridão, Abnorú trabalhou duro para construir uma casa de madeira para poder abrigar Adelly que estava prestes a dar a luz na época, e depois de algum tempo, um menino forte e saudável nasceu fazendo com que Abnorú e Adelly recebessem aquele em que acreditavam que iria trazer o trono de volta para ambos.

   Seu nome seria Erick, diferente dos costumes do reino que mandavam colocar nomes que começassem com a letra A, pois eles acreditavam que seu filho seria diferente, se destacaria diante de todos e seu nome seria lembrado por gerações futuras como aquele que vingou sua família. Erick estava destinado a coisas grandiosas, e Adelly tinha certeza disso.

   As crianças cresciam com realidades e criações opostas, a princesa era muito mimada pelos funcionários do reino, ainda mais por seus pais, crescendo e se tornando uma doce e adorável garota amada por todos dentro daquele castelo. Enquanto Erick, com sete anos de idade, era treinado todos os dias por Abnorú para se tornar um grande guerreiro, dominador das técnicas da espada.

   – Segure a espada assim, e nunca tire seus olhos do oponente! Preveja seus ataques e com isso, esteja sempre dois passos a frente dele. Isso não inclui somente nas batalhas, meu filho. Lembre-se disso. – Disse Abnorú segurando sua espada em frente ao Erick.

   O garoto tentava reproduzir os movimentos do homem à sua frente com sua espada de madeira, enquanto sua mãe os observava na porta de casa com uma xicara de café. Adelly sabia que Abnorú era esperto e que não estava ensinando o que sabia para o garoto em vão, ele certamente tinha um plano envolvendo o pequeno, e ela não se sentia muito segura com isso, ainda mais se um dia Abnorú descobrisse quem era o verdadeiro pai de Erick.

   No castelo, a pequena princesa comemorava seu aniversário de cinco anos com um grande bolo, rodeada de cozinheiros, servos, alguns oficiais, mordomos, damas e, é claro, os soberanos, que tentavam fazer da vida da pequena princesa a mais normal possível. Ariana participava de aulas particulares, o que a mantinha ocupada na maioria do tempo. Para a pequena garota, nada estava fora do comum, mas seus pais sabiam que um dia Ariana perguntaria o porquê de nunca ter saído do castelo.

   – E então, o que achou do bolo? Foi o Adam que fez. – Disse o rei ajeitando a pequena princesa em sua cama para enfim descansar do dia divertido que teve.

   – Estava muito bom! Principalmente a parte do chocolate!

   – Que bom que gostou, minha menininha está crescendo, mas então me diga o que aprendeu ontem nas suas aulas?

   – Na verdade ainda estou aprendendo. Tem tantos talheres para usarmos que eu acabo me confundindo, mas a senhorita Átila está me ajudando com isso. O senhor também teve que aprender sobre talheres?

   – Sim! Eu achava algo muito irritante quando tinha a sua idade, e Abnorú então! – Atter disse ficando sério quando percebeu ter tocado naquele assunto.

   – Já vi o senhor falar algumas vezes sobre esse outro senhor, quem é ele?

   Atter abaixou o olhar engolindo em seco, voltando a encarar o meigo rosto de sua filha enquanto passava a mão nos cabelos ruivos da mesma, na qual havia herdado dele.

   – Ninguém importante, nada que mereça a atenção dessa linda garotinha aqui! – Ele disse fazendo cócegas na garota que ria sem parar.

   Momentos como esse fazia Atter se sentir revigorado, apenas por ter sua querida Ariana perto dele. O rei ainda estava preocupado com a mecha branca de cabelo da menina mesmo percebendo que nada de anormal havia acontecido com a mesma. Nada, nenhum sinal, nenhuma demonstração. Ariana era uma menina comum, e isso aliviava o coração do homem ao pensar sobre ela, porém, quando se lembrava de Adelly, as coisas eram diferentes.

   – Papai, podemos andar de balanço amanhã? – Ariana perguntou chamando a atenção de Atter novamente.

   – Tudo bem, mas só depois de todas as suas aulas! Agora durma, você tem um dia inteiro cheio de compromissos amanhã. Boa noite, minha florzinha.

   – Boa noite, papai.

   Ao perceber que Ariana estava prestes a pegar no sono, Atter se levantou da cama saindo do quarto, indo em direção ao seu. Durante o caminho, ele pensava se não a aborrecia com tantos afazeres, mesmo tão nova. Mas ele mesmo se tranquilizava falando para si que essa era a melhor maneira de fazer com que Ariana fosse bem instruída, além de estar sempre ocupada para pensar em sair do castelo.

   Já as pessoas do reino pensavam que a filha do rei e da rainha não aparecia em público por ser um grande alvo de Abnorú, que nunca mais deu as caras pela cidade. E com isso, sabendo que ele nunca mais poderia voltar, todos estavam tranquilos achando que estavam seguros, entretanto, Abnorú estava formulando seu plano para voltar, e surpreender a todos, sem chance de ser derrotado.

   Ao chegar a seu quarto, encontrou sua esposa na janela observando a noite antes de se deitar. A mesma se aproximou do marido tirando sua coroa colocando em cima de uma almofada, enquanto o homem tirava sua capa para colocar algo mais confortável.

   – Ela estava animada, não? – Alina disse indo até a cama.

   – Não era para menos. Logo estaremos comemorando seus dez anos, e logo seus quinze... Ela está crescendo rápido demais... – Disse o rei se sentando na cama.

   – E que benção é isso, meu querido. Ariana está crescendo e tudo está em perfeita ordem! Como você disse que estaria!

   – É claro... É uma benção sim... Mas... Não vou negar que tenho medo do futuro, Alina. Sabemos que ela não será inocente para sempre. Um dia Ariana vai querer saber por que nunca pôde sair, ou até mesmo pode querer ignorar nossos avisos e sair mesmo assim! Hoje inclusive ela me perguntou quem era Abnorú... – Disse o rei, nervoso...

   – Eu sei disso... Por isso temos que instruir Ariana aos poucos, e um dia contaremos a verdade para ela, e enfim ela saberá o motivo de a protegemos sempre. Mas fique tranquilo, ela é apenas uma criança, não fará nada, eu tenho certeza.

   – E... Sobre a mecha branca? Não sabemos o que significa... E se ela for como Adelly?

   – Eu acredito que Adelly é inocente, e que seu cabelo foi apenas uma coincidência. Não acredito que ela possa lidar com magia ou o que quer que seja. Muito menos nossa filha, Atter. Nós nunca vimos algo anormal em Ariana, nem mesmo em Adelly. – Disse Alina segurando as mãos do marido.

   – Espero mesmo que você tenha razão, meu amor. Só espero poder resolver isso logo. Ainda mais sabendo que Abnorú está à solta...

   – Seu irmão... Acha que ele está planejando algo?

   – Conhecendo ele, eu tenho certeza... Já o povo acredita que está seguro sem ele por perto, achando que esse é o final feliz de um conto de fadas... Eu até prefiro que eles pensem assim, pois um povo com medo pode gerar um caos incontrolável.

   – E como pretende lidar com esse assunto? Como vamos prever quando Abnorú vai fazer alguma coisa?

   – Temos que estar sempre a dois passos dele, como meu pai dizia quando nos ensinou a lutar. Temos que prever seus ataques. Abnorú é muito inteligente e por incrível que pareça, quando se trata de vingança, ele pode esperar o tempo que for, até mesmo anos, para que ele consiga o que quer. Por isso, eu reforçarei meu exército, para proteger o reino e inclusive para futuras guerras. Não sabemos se ele vai se aliar a um reino e guerrear contra o nosso futuramente. Abnorú é um ótimo guerreiro, você se lembra de como éramos vistos? Nós éramos os melhores guerreiros da nossa juventude, e ele na verdade sempre treinou mais do que eu, portanto hoje ele seria uma grande peça para outro reino, tendo tantos números de vitórias em guerras.

   – É eu sei... Abnorú é perigoso... Não podemos dar oportunidades a ele. Por enquanto Ariana estará sob nossos cuidados, mas... Não poderemos estar sempre com ela quando crescer.

   Atter se levantou andando pelo quarto tentando pensar em algo que mantivesse Ariana a salvo de qualquer ameaça, até surgir um nome em sua cabeça.

   – Axel.

   – O quê?

   – Axel conhece os nossos guerreiros melhor do que eu, portanto talvez ele consiga achar alguém para ser o guardião da nossa filha. Assim ele sempre estará com ela impedindo-a também de querer sair do palácio, protegendo ela de Abnorú, e de qualquer pessoa que queira fazer mal a ela. O que acha?

   – É uma ideia ótima, mas também é muito perigoso, precisamos ter cuidado ao realizar isso e escolher muito bem quem estará ao lado de Ariana, afinal, é a nossa filha, não podemos cometer erros.

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