3. Alexia

O Jato da empresa aterrissou no aeroporto de Santa Maria, bem cedo. Ainda era cinco e quinze da manhã, o sol nem apareceu. Antecipei meu retorno por causa da ligação do Marcos, pois, ele tinha algo importante para falar comigo. Eu só voltaria segunda feira, iria aproveitar as praias de Fernando de Noronha que eram lindas e convidativas. Dois meses de trabalho sem nenhuma folga, só arrumava tempo para os meus encontros semanais com Heitor, fora isso, não tive descanso. E como essa semana o Marcos e a Carla iriam viajar com Heitor, então, resolvi esticar essa folga. Precisava de um final de semana para descansar, porém, esse telefonema me deixou muito preocupada, então, resolvi antecipar a minha volta. Pelo Heitor, faria qualquer coisa.

Com minhas malas em mãos, fui para o estacionamento do aeroporto. Flavio já estava me esperando com o meu carro ligado. Ele voltou no dia anterior, para poder me buscar de carro no aeroporto. Depois das ameaças anônimas e a tentativa de sequestro, ele ficou mais cauteloso. Sempre tinha um segurança comigo, como ele mesmo dizia, seus “comparsas de responsa.” Ele nunca permitia que eu ficasse sozinha. Porém, quando eu precisava ser discreta, era o Flavio que me acompanhava. Ele sabia sobre o Marcos e o Heitor, sempre ia comigo nos meus encontros com eles. Por isso, ele voltou no dia anterior, para arrumar tudo para o nosso encontro como sempre fazíamos.

— Bom dia, Alexia! Está tudo planejado como combinado — A gente sempre falava em código, não que ele não confiasse nos seus comparsas, era só porque eu queria assim. — Vou te levar para seu apartamento e quando for a hora, seguiremos com o protocolo. — Ele estava todo besta falando difícil, como se fosse um intelectual. Só porque comprou um terno, estava se sentindo um agente do FBI, isso me fez rir. — O que foi?

— Nada! É que eu nunca pensei em te ver falando difícil.

— Está zombando da minha cara?

— Não, é que eu achei fofo. — Ele me olhou torto.

— Você não parece a Alexia que conhecia no ensino médio — Olhei para ele intrigada. — Aquela Alexia era mais durona, intimidadora, acho que o caipira mudou você.

Putz! Ele tinha que mencionar ele? Enfiei a cara no trabalho tentando esquecer os meus problemas e a saudade que sentia do Romão, do seu corpo, do seu beijo, do seu... Foco, Alexia! Flavio tinha que me lembrar, me fazer voltar a realidade de que não podemos ficar juntos, principalmente agora, com essas ameaças.

Flavio colocou minhas malas dentro da porta mala. Enquanto me acomodava no banco do carro, Flavio dava instruções para seus comparsas que iriam no outro carro. Esses comparsas foram aqueles que nos ajudaram a resgatar a fazenda do Romão com o agiota. É, eu contratei a cambada toda, fazer o que!

Flavio sentou ao meu lado e ligou o carro.

— Você deveria ir no banco de trás, sabia? É mais seguro.

— Não gosto de ir no banco de trás, fico enjoada.

— Olha! Não é gravidez, não?

— Vira essa boca para lá — Bati no ombro dele. — Tem mais de dois meses que eu não transo — eu falei isso alto?

— Está subindo pelas paredes, já?

— Se concentra no trânsito, por favor?

Esse idiota ficou rindo da minha cara. Dois meses sem sexo, dois meses que acabei com o meu caso com Romão. Nem o meu toy estava servindo como substituto, eu estava ferrada! Pelo menos, fiquei com a mente ocupada nesses dois meses, não tive tempo para pensar em besteiras. Só não tive tanta sorte com os meus sonhos, quase toda noite sonhava com ele. Não conversamos mais sobre nós, na verdade, fiquei com medo de responder para ele o que sentia. Talvez seja o certo a se fazer, não iríamos dar certo mesmo. Agora que já se passou tanto tempo, depois da nossa última conversa, não sei como vai ser quando tivermos a oportunidade de ficarmos sozinhos.

Fiquei fazendo hora no meu apartamento, até chegar o momento em que iria me encontrar com Marcos. Combinamos de nos encontrar as dez horas em ponto, tinha tempo suficiente para descansar, mas estava tão ansiosa por esse encontro, que não conseguia pregar o olho. Olhava constantemente o meu pingente, pensando o que de tão importante Marcos queria falar comigo. Chegamos no restaurante dez minutos antes do horário marcado, estava muito agitada, não conseguia me acalmar. Marcos chegou cinco minutos depois, diminuindo meu nervosismo. Ele sentou à minha frente e fizemos nossos pedidos, depois que o garçom se afastou começamos a conversar.

— Eu te liguei porque tinha uma coisa para te contar.

— Pode falar, é algum problema com Heitor? Ele está bem?

— Ele está bem, sim. O problema é com a Carla — Respirei fundo me preparando para bomba. — Eu estava preparando a Carla para poder contar sobre você e para você poder aparecer na ceia de natal, mas o Heitor viu você na televisão e deixou escapar que te conheceu.

— Ela não gostou? — Ele fez uma careta descontente.

— Ela está irredutível, ela não quer você perto do Heitor.

Meu coração disparou, me mexi inquieta na cadeira, passei a mão pelo cabelo tentando não pirar. Era o que eu temia, Carla com sua superproteção, não iria facilitar para mim.

— Tem alguma coisa que eu possa fazer, conversar com ela por exemplo?

— O problema dela não é tanto você se aproximar do Heitor, o problema é que ela tem medo que você o tire da gente.

— Eu jamais faria isso! Eu já disse para você.

— Eu sei, mas também tem as fofocas sobre você com um namorado a cada dia. Ela está insegura e devo te dizer que sua imagem não está boa, ela tem medo que isso atinja o Heitor, caso venha a público que você é a mãe dele.

— Eu pretendo esconder ele ao máximo da mídia.

— Mas uma hora ou outra a bomba vai explodir e temo que o Heitor seja afetado.

Achei melhor não contar para ele da tentativa de sequestro e das ameaças, pois, era bem capaz que o próprio Marcos não deixasse que eu visse o Heitor.

— Eu não sei o que posso fazer em relação as fofocas, não posso controlar, no máximo posso encontrar o fotógrafo que tirou as minhas fotos.

— Ou, então você pode encontrar um namorado, para poder expor na mídia, isso diminuiria bastante as fofocas. Cadê aquele cowboy que você falava dele toda derretida? 

Eu o que? Eu não ficava derretida, ficava? Não acredito que o Marcos falou isso, mas não podia culpá-lo, ele não sabia o que estava acontecendo na minha vida agora. Ainda não tinha contado que terminamos o nosso caso.

— Não conversamos há dois meses, não dá para colocá-lo na minha vida assim, sem mais nem menos. E você sabe muito bem que não podemos ficar juntos, por causa daquilo. — falei baixo e olhei para os lados para ter certeza que ninguém nos ouvia. — Acho que a primeira opção é a mais viável.

Romão era meu sócio, filho do Francisco que era sócio do meu pais. Não daria certo um relacionamento entre nós dois, principalmente, com as ameaças que venho tendo. Não suportaria se algo acontecesse com ele, já tinha que se cautelosa com Heitor, não precisava de mais preocupação.

— Talvez seria uma boa ideia se ele soubesse da verdade.

— Isso está fora de cogitação.

— Você poderia ficar juntos e Heitor ficaria feliz se ele soubesse...

— Marcos! Esse assunto está fora de questão.

— Tudo bem, eu só comentei sobre ele, porque você parecia estar apaixonada quando falava dele.

Ok! Devia ter sido uma cena patética, eu, com cara de apaixonada, contando para o Marcos sobre uma pessoa que não podia ser nada minha vida, além de sócio. Devido as circunstâncias atuais e passadas, não daria certo esse relacionamento.

— Eu vou identificar o fotógrafo o mais rápido possível e desfazer essa imagem.

— Enquanto isso, vou conversar com Carla, tentar convencê-la de te deixar ver o Heitor.

— Obrigado, Marcos! Obrigado por tudo que tem feito por mim e pelo o Heitor.

— Eu é que agradeço pela vida do Heitor, ele é a nossas vidas e você merece estar perto dele, merece ser feliz.

Terminamos nossa refeição e nos despedimos, já era meio dia de uma sexta-feira, tinha a tarde inteira para adiantar o meu trabalho, para que no dia de natal e na sua véspera, eu não precisasse trabalhar.

Flavio me levou direto para empresa, com a minha esperança renovada, ao mesmo tempo, um pouco apreensiva. Precisava dar um jeito nessa bagunça em que me enfiei, encontrar esse fotógrafo e refazer a minha imagem. Talvez pudesse oferecer uma oportunidade na minha empresa, para trabalhar na assessoria de imprensa, já que eu ainda não consegui alguém de confiança para assumir esse cargo.

Sei que seria loucura contratar alguém que me prejudicou, mas era como dizia o ditado: “tenha seus amigos por perto e seu inimigos mais perto ainda.” E também, não foi isso que fiz com o Romão, quando ele resolveu não trabalhar mais na empresa? Tive que comprar a fazenda, com meu próprio dinheiro. Bom, não era bem o meu dinheiro, era do meu pai, mas ele não iria utilizá-lo mesmo, então, usei para uma boa ação, salvar a empresa. Mas minha preocupação na época, era ter com o que viver, se eu ficasse sem a empresa, pelo menos, teria a fazenda para sobreviver.

Minha intenção era fazer que o Romão recuasse e voltasse a trabalhar na FazenTéc, algo que consegui, mas se ele não aceitasse, eu estaria disposta a tirar a fazenda dele. Porém, o carinho e o amor que os pais dele me recepcionaram, principalmente, depois que eu disse que resgatei a fazenda do agiota, me conquistaram inteiramente. Me senti, realmente parte de uma família e com o tempo Romão também me conquistou com sua simplicidade, seu jeito debochado de me provocar e me tirar do sério. Me desarmava toda vez que ele me colocava no meu devido lugar, me fazendo entender que eu não era o centro do universo e que precisava ser mais humilde com as pessoas simples e ser arrogante com aqueles que achavam ser superiores. Me fez entender quem era os meus inimigos e aqueles quem eu podia confiar. Isso fez com que ele conhecesse uma outra Alexia.

A Alexia de antes da fuga. A Alexia de antes de conhecer o cara errado e engravidar. A Alexia que se encontrou em uma fazenda e nos braços de um cowboy, que ficou muito sexy de terno e gravata e sem aquelas pelugens pavorosas.

Caramba! Como eu estava com saudades dele! Enfiei a cara no trabalho, para não ter que pensar no Romão, o que resultou um crescimento considerável da empresa, apesar de ainda termos muito caminho a percorrer, mas foi só alguém pronunciar o seu nome que as lembranças vieram com força. O seu toque, o seu beijo, o seu cheiro, as sensações que sentia quando estávamos... enfim! Nunca nenhum homem me tocou daquela forma que podia arrancar o meu juízo. Só um toque dele, podia sentir aquela eletricidade que emergia de nós, fazendo a minha pele se arrepiar com um simples contato.

Constatei uma enorme vontade de vê-lo, nem que só pudesse olhá-lo sem precisar tocar, só queria tê-lo por perto. Francamente, me tornei patética, uma completa idiota apaixonada que se contentaria só em ver o alvo de sua paixão, mesmo que ele não me quisesse por perto, eu só queria vê-lo.

E foi nesse ímpeto que abri a porta de sua sala sem bater e vi algo que fez meu mundo desabar. Romão estava... merda! Ele seguiu em frente, tinha outra pessoa em sua vida. Talvez fosse melhor assim, já que não poderíamos ficar juntos. Mas quem era essa mulher? Tive a impressão que a conhecia de algum lugar. Os dois se assustaram com a minha entrada repentina e ficaram desconfortáveis.

Romão encostou na sua mesa e ficou de cabeça baixa, não conseguindo me encarar. Já aquela.... nem sei o nome dela. Ela estava um pouco afastada do Romão e também de cabeça baixa, mordia o lábio inferior tentando disfarçar o sorriso.

É, sei bem o que era isso, me sentia assim, todas as vezes que Romão me beijava e constatar isso me doía muito.

Demorei alguns segundos para me recompor, segundo intermináveis, nunca demorei tanto tempo para voltar a minha postura normal. Caminhei alguns passos em direção à mesa do Romão, ele levantou a cabeça para me encarar, parei no mesmo instante que seu cheiro alcançou as minhas narinas e senti o meu corpo reagir daquela maneira estranha. Lágrimas queriam se formar em meus olhos e um bolo se formou em minha garganta. Tive que respirar fundo para poder falar, o que fez o Romão franzi a testa.

— Preciso dos relatórios financeiros dos últimos dois meses.

Minha voz saiu contida, autoritária e um pouco angustiada demais para meu gosto. Nem precisava dessa porcaria de relatório, só precisava de uma desculpa para ter aparecido ali, já que os peguei em flagrante. Não queria admitir que só queria vê-lo.

Romão mordeu o lábio inferior de nervoso e passou a mão nos seus cabelos que estava um pouco volumoso, deixando um aspecto um pouco bagunçado e sexy, me fazendo perder o foco por um instante. É, ele mexia comigo de todas as formas possíveis.

Eu estava ferrada!

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