2. Romão

Mais uma reunião encerrada, ainda era manhã de uma sexta-feira, cheguei um pouco atrasado no trabalho, devido ter dormido tarde na noite anterior. Não estava exausto, mas também, não estava com pique para conduzir uma reunião.

— Excelente trabalho, pessoal! — falei terminando mais uma reunião. — Continuem com os projetos, semana que vem quero um relatório de tudo o que vocês têm feito, para poder aprovar o investimento. — Levantei arrumando os documentos em minha frente. — Estão dispensados.

Os diretores saíram um de cada vez da sala de reunião, essa era a terceira reunião que eu e Patrícia gerenciamos juntos, sem Alexia. Depois do seu discurso na festa anual da empresa, ela quase não parou quieta no lugar. Alexia estava sempre viajando para conseguir novos investidores para empresa, dificilmente a vemos. Quando aparecia na empresa, era só para uma visita rápida de um dia e logo viajava de novo.

Todo dia aparecia notícias sobre ela na televisão com supostos namorados, mas o que mais me intrigava era que, quando era questionada, ela não negava, nem afirmava ser verdade ou não. Isso me deixava aperreado! Me fazendo pensar em milhões de besteiras. Não conversamos mais sobre nós, aliás, nem sei se ainda existe um “nós.” A última conversa que tivemos, ela me pediu para que eu confiasse nela e tivesse um pouco de paciência, me dando esperança que ficaríamos juntos. No entanto, já fazia dois meses e minha paciência estava no limite. Ela não tinha dito o que sentia por mim, mas ela sabia muito bem como eu me sentia em relação a ela.

As festas de fim de ano estavam próximas, mamãe já tinha tudo planejado para o natal e o ano novo, só precisava da confirmação da presença das irmãs Bitencourt.

Patrícia já confirmou a sua presença, ela não iria perder a oportunidade de passar as festas de fim de ano ao lado do Miguel. O relacionamento deles estava cada vez mais sério, o que me deixava feliz e com um pouco de inveja ao mesmo tempo. Apesar que, nos últimos dias eles estavam se estranhando, precisava conversar com Patrícia para ver se estava tudo bem entre eles.

Alessandra aceitou passar o natal com a gente, mas o ano novo, ela disse que iria passar com o novo namorado, da qual, ela não disse o nome, o que deixou Patrícia muito intrigada.

Alexia, por sua vez, não dava a resposta ao convite que tinha sido feito com antecedência, de passar o natal na fazenda, porém, no dia que a convidei, ela simplesmente desconversou e saiu para mais uma viagem de negócios. Fiquei frustrado, queria muito saber qual era a sua resposta, talvez nem ela mesmo soubesse, já que ela entrava e saía de reuniões e viagens de negócios. E ela estava fazendo um excelente trabalho.

Desde o dia do seu discurso, em que as ações caíram, a empresa vem se reerguendo, consideravelmente, em apenas dois meses. Os resultados eram satisfatórios, contudo, havia um longo caminho a ser percorrido ainda. Definitivamente, Alexia era uma mulher incrível, uma grande empresária, eu a admirava de todas as formas, ela sabia o que queria e não media esforços para conseguir.

Fui interrompido dos meus devaneios pela intromissão inoportuna de alguém abrindo a porta. Era a minha secretária que veio trazer o relatório que pedi da última transação feita pelo departamento de marketing. Tinha que admitir essa nova diretora de marketing estava fazendo um ótimo trabalho, bem melhor do que o Conrado fazia. Apesar de ter a impressão de que a conhecia de algum lugar, pois ela não me parecia estranha. Percebia ela me encarando nas reuniões, o que me deixava cismado e constrangido. Talvez não seja nada, talvez seja somente impressão minha.

— Está aqui, o que o senhor me pediu.

— Obrigada, Eloisa!

Ela fez um sinal com a cabeça e depois saiu. Olhei para aquele relatório e fiz as contas para saber se estavam corretas, e estavam. Aquele departamento que antes era o que dava mais prejuízo, agora era o que mais dava retorno à empresa. O pior era que eu nem sabia o nome da diretora. Era uma vergonha não saber o nome da minha companheira de trabalho. Apesar que nem me preocupei em procurar seu nome nos relatórios.

Continuei trabalhando normalmente, até que minha porta se abriu novamente, revelando a silhueta da minha prima que sorria alegremente, trazendo consigo duas xicaras de café.

— Pausa para o café.

— Ah, que bom, meu cérebro precisava mesmo de energia para não entrar em curto. Precisava de mais um pouco de energia.

— Vi que você não tomou café no refeitório.

— Eu já tinha tomado antes de sair de casa — Mentira! Saí atrasado e não deu tempo de tomar café. — O que me faz lembrar que ainda preciso arrumar um lugar para mim.

— Pode ficar o tempo que quiser no meu apartamento, eu não vou precisar ainda.

— Ainda? Tem planos para o futuro?

— Não sei, eu já comentei com Miguel em morarmos juntos, mas ele sempre desconversa.

— Sério? Ele está fugindo do compromisso? Se quiser eu posso dar uma lição nele.

— Não será preciso, só foi uma ideia, ainda não decidi.

— Quando decidir me avisa que eu dou um jeito nele.

Ela sorriu, mas seu sorriso não chegou aos olhos, tinha um pouco de tristeza na fisionomia dela, talvez a recusa do meu amigo esteja a incomodando. Precisava saber o que estava acontecendo, talvez eu pudesse ajudar, mas acho que isso não era assunto para se falar agora.

— Tenho boas novas! — Agora ela ficou um pouco mais animada.

— O que? O menino Jesus já nasceu?

— Como? — Acho que ela não entendeu a piada.

— Deixa para lá! Me conta, quais são as boas novas?

— Falei com Alexia essa semana, ela disse que segunda-feira estará de volta e só voltará a viajar depois das festas.

Só o seu nome ser mencionado, meu coração bateu mais forte, tinha uma semana para convencê-la a passar o natal e o ano novo comigo, digo, com a gente na fazenda.

— Você sabe onde ela passará as festas de fim de ano?

— Eu perguntei para ela, Alexia disse que só poderá me responder quando estiver de volta. Parece que ela terá algumas reuniões na cidade.

— Alexia precisa descansar, que eu me lembre, desde que essa correria começou, ela não parou nem um minuto.

— Eu sei, vou tentar convencê-la de passar o natal na fazenda, vai fazer bem para ela, os animais a acalma, a fazenda a acalma, você a acalma.

Dei-lhe um sorriso triste, passando a mão na cabeça, sem saber o que pensar.

— Eu acho que não faço mais esse efeito nela.

— Ela não te ligou?

— Só para falar sobre trabalho e também não queria conversar por telefone sobre um assunto que temos que conversar olhando nos olhos.

— É, você tem razão! Bom, segunda-feira ela estará aí, você terá a sua oportunidade.

— É o que eu espero!

Patrícia saiu da minha sala, assim que terminou o seu café, levando minha xícara consigo. Passei o restante da manhã submerso nos documentos financeiros, até a hora do almoço. Foi quando alguém bateu na porta da minha sala. Me levantei para guardar os documentos em que eu estava trabalhando, dando permissão para minha secretária entrar, com certeza ela vinha avisar que estava saindo para almoçar. Como não a ouvi falando nada, já que estava de costas para ela, me virei e dei de cara com a nova diretora do departamento de marketing.

Ela era uma mulher linda, cabelos castanhos claros, olhos cor de mel, usava uma saia preta apertada evidenciando as curvas do seu quadril. Uma camisa de botão branca com dois botões abertos, mostrando o volume dos seus seios, um blazer preto por cima da blusa, um sapato fechado de salto, também preto e meia calça. Ah, eu adorava mulher de meia calça. Ela olhava para mim toda sorridente, o que me fazia pensar, o que ela queira na minha sala?

— Se veio atrás do relatório, eu não terminei, depois do almoço eu termino e peço para minha secretária enviar para você.

Senti que fui um pouco rude, nem disse boa tarde, nem a convidei para sentar, só despejei aquelas palavras sem me importar com nada. Eu estava estressado e faminto, a segunda opção eu poderia resolver imediatamente, mas a primeira...

— Eu vim te convidar para almoçar comigo.

Olhei para ela surpreso, não esperava esse convite, muito menos vindo dela, já que nunca conversamos antes.

— Eu não sei o que dizer.

Realmente não sabia, fui pego de surpresa.

— É só dizer que aceita almoçar comigo. Para podermos relembrar os velhos tempos. — Acho que fiquei com cara de palhaço, pois ela começou a rir da minha cara. — Você não lembra de mim mesmo, não é?

— Eu deveria? — Estava muito confuso, apesar que ela me parecia familiar.

— Ok! Eu vou facilitar para você. — Ela se aproximou de mim, fixando seus olhos nos meus. — Lembra da capelinha abandonada, da qual você fez aquela promessa.

Puxei na minha memória de que capelinha ela estava falando. Lembrei de quando eu era adolescente e tinha uma capela abandonada próximo a minha fazenda, da qual, hoje não existia mais. Ela foi construída no século XXIII e foi abandonada por causa dos assaltos constantes. Ainda existia o crucifixo em uma parede, parcialmente demolida, mas o novo bispo, recentemente, retirou todos os objetos e imagens sacras para serem restauradas. Eu gostava de brincar nessa capelinha quando era criança, foi quando me dei conta da promessa que ela estava falando, a única vez que fiz alguma promessa diante de uma capela, eu era adolescente e estava com a...

— Mig?

Ela abriu um sorriso enorme e mais uma vez eu fiquei sem saber o que falar. Ela estava diferente, ainda podia ver os traços daquela garota em que eu era apaixonado na minha adolescência. Ela se desenvolveu bastante, me peguei observando seu corpo descaradamente, ela estava linda, seu sorriso continuava lindo como sempre foi, porém, eu sentia que tinha algo de errado, como fosse e não fosse ela ao mesmo tempo. Fiquei agitado com sua presença ali na minha sala, como a sensação de estar fazendo algo que não devia. Mas o que me encomendava mesmo, foi aquela bendita promessa que fiz anos atrás, será que ela veio cobrar?

— Eu nunca esqueci de você em todos esses anos.

Ai, merda! Eu gostaria de dizer o mesmo, mas não era o caso. Eu tive outras namoradas, paqueras, ficantes, arrochos de uma noite e fora que, da forma como ela me deixou, me fez seguir em frente. No entanto, eu sempre sentia que nossa história era mal resolvida, como se não tivéssemos a oportunidade viver tudo que tínhamos que viver, ou talvez precisávamos pôr um ponto final naquilo de uma vez por todas. Mas sinceramente, eu estava confuso, não sabia como fazer isso. Tinha um grande “SE” entre a gente.

— Acho melhor deixar esse almoço para um outro momento, agora não dá para conversar.

— Eu sei! Temos tanto para dizer um para o outro, quando vi que você era um dos meus chefes, eu pensei que você viria falar comigo, foi quando me dei conta que você não lembrava de mim.

Nem percebi quando ela se aproximou mais, estávamos muito próximos um do outro, eu podia sentir muito bem o seu perfume, o mesmo que ela usava quando erámos adolescentes e que eu adorava.

— Aconteceu tantas coisas que você nem pode imaginar, eu herdei uma parte dessa empresa e agora eu ajudo a administrar com a Patrícia e Alexia.

Meu coração pulou quando mencionei o nome dela, Alexia tinha um efeito incomum sobre mim, sobre meu corpo e mesmo diante de uma pessoa do meu passado, alguém que eu já amei, alguém que eu tinha uma história mal resolvida. Alexia se fazia presente, mesmo não estando.

Mig se aproximou mais, passando as mãos pelo meu peito por cima da camisa, imediatamente, fiquei tenso. Depois de todos esses anos, ela ainda mexia comigo, não da mesma formar como Alexia mexia, era mais como uma necessidade de consertar o passado e eu estava com medo desse sentimento.

— Teremos tempo para conversar, já que agora você será o meu chefe, você pode me contar aos poucos e podemos relembrar os velhos tempos.

Sem ao menos esperar seus lábios já estava nos meus, suas mãos em meu pescoço e nossos corpos colados. Pensei em pará-la, afasta sua boca da minha, mas ao invés disso, segurei em sua cintura e aprofundei o beijo para ver o que eu sentia, em relação ao que a gente já viveu.

O beijo não era do jeito que eu me lembrava, a pele da sua boca não era tão macia como costumava ser, somente o sabor de morango resultado do batom que sempre usava, ainda era o mesmo. Mas o que mais me impressionou, foi que eu não senti nada. Não senti desejo, não senti tesão, não senti carinho, nada! Era como se eu estivesse beijando alguém que acabava de conhecer. Não houve emoção nenhuma, era apenas um beijo e nada mais.

A porta da minha sala abriu de repente, me deixando em alerta, eu conhecia bem aquele jeito de abrir a porta, aquela atitude incisiva de entrar na minha sala sem bater. Congelei me afastando rapidamente da Mig, mas não fui tão rápido como queria, ela já estava dentro da minha sala com os olhos arregalados em nossa direção.

Droga!

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