No Limite

Assim que abriu os olhos a cabeça doía, com o sangue fluindo para o único lugar possível, e por um momento parecia que seus tímpanos iriam explodir ouvindo o coração descompassado, tentando bombear o líquido ferroso por todo o corpo. 

A visão estava turva com o sangue latejando a cabeça e por pouco tudo não ficava escuro e sem foco. Endy não sabia quanto tempo estava, ali, de cabeça pra baixo pendurada por uma única perna na armadilha, que ativava por puro azar e seu próprio desprezo. 

Não demorou mais que alguns segundos pra recordar o que estava acontecendo, ela não precisou de muito apenas vislumbrar uma árvore desgalhada e dois vultos caídos na neve, como se recebessem um forte abraço dos pequenos flocos e sem forças pra lutar permaneciam estáticos esperando que algo acontecesse por si só. 

Endrelina reunia cada grama de magia restante para produzir pequenas chamas, mas tudo que conseguia eram inconstantes faíscas que lentamente corriam a corda, enquanto se agarrava a haste que a prendia. Com um esforço mental herculano a corda cedeu a derrubando de costas, e por sorte o solo branco amorteceu a queda, mas nem por isso a dor era menor em suas costelas, que não quebraram por pouco e a coluna parecia fora de seu lugar.  Não era uma coisa que ela sabia mais algo que ela sentia por todo o seu ser. 

Se erguendo grunhidos a situaram na realidade. Foi com pesar e surpresa que percebeu que a batalha ainda não tinha acabado. Tudo que almejava era voltar ao conforto da neve se permitindo um longo descanso e um bom sonho. Porém Verke esmagava o caçador com seu corpo opulento enquanto seus dedos se fixavam a garganta do jovem caído. O canino também gemia com a face deformada, a pele em carne viva em algumas partes, os ossos do rosto estavam a mostra, e pra completar o horror um olho quase pendia pra fora da órbita derretido, ao. lado do outro um corte profundo surgia escorrendo sangue.  

O caçador parecia sem vida e a única coisa que o mantinha no mundo dos vivos era uma frágil respiração. Endy não sabia o que fazer, ela queria ajudar mais não tinha a menor idéia de como executar seus pensamentos. A garota pulou nas costas de Verke mais tudo que conseguiu foi ser jogada pra longe como se não fosse nada. Ela saiu rolando e diante dos seus olhos havia um arco quebrado e um objeto negro afundado na neve. Ela não pensou duas vezes sacando o cabo negro e usando toda a força puxou a foice que deixava uma vala nos flocos esbranquiçados. Os braços queriam ceder mais o garoto mal tinha cor e em seu rosto um tom roxo surgia no lugar da vermelhidão da pele alva. Endrelina girou o quadril e com todo vigor que lhe restava golpeou a cabeça de Verke pelas costa, que caiu com um baque surdo. Morto.

O caçador não mudava de cor pelo contrário o rosto alvo era uma mancha negra de sangue e dióxido de carbono. Ela tentou respiração boca a boca e sem sucesso se deu conta que o canino ainda estava encima do peito do garoto. Foi com um esforço herculano que produziu pequenas rugas no rosto dela enquanto puxava o gordo. Quando de fato consegui caiu de costas sentindo a brisa gelada afagando o suor que percorria o cenho e as outros membros exaustos. Sem aviso prévio o caçador se ergueu respirando fundo, como se despertasse de um sonho onde morria afogado, era possível ouvir naquela respiração afobada o desejo de mais um pouco de vida, de alguém que não se daria por vencido até que de fato fosse abraçado pela morte e assim como levantou tornou a cair, dessa vez em profundo sono.

Endrelina assustada agarrou a primeira coisa que seus dedos encontraram na neve. Em suas mãos uma pedra azulada se desfazia enquanto adrenalina e medo congelaram em seus veias. Ela ficou fitando o céu de um cinza denso que por vezes parecia tão sereno quando o mar turbulento, mas naquele instante tudo parecia suavemente calmo e tranquilo. Por muito tempo ela desejou que permanecesse assim desesperada por um pouco de controle e equilíbrio.  O que de fato sempre pareceu alheio a sua personalidade descontraída e curiosa. 

Mais uma vez a garota se levantou, olhou para os lados  confirmando que tudo havia acabado que não surgiria mais ninguém de alguma lugar secreto e a atacaria de novo sem motivo algum. Já que estava de pé a curiosidade obrigava a ver como ele estava. Os passos eram capangas e quanto mais andava novas dores surgiam, como se esperassem algum movimento pra se revelar. O rosto estava arranhado assim como os braços e fitando de cima a jaqueta mal parecia existir,  por baixo a camisa rasgada podia se ver alguns cortes e marcas de pancadas de todas as cores possíveis. 

O ar escapou vagarosamente pelos pulmões em uma respiração longa e profunda, ela ainda tinha trabalho a fazer. Sem muito recursos tudo que podia fazer era improvisar e lamentar não saber nem um feitiço de cura,  nos quais sua mãe era especializada. Endy tirou a jaqueta e a rasgou sabendo que não serviria pra mais nada. Depois deixou o peito do caçador nu fitando o abdômen levante definido,  porém o que lhe chamava atenção eram as cores inconstantes e a quantidade de sangue coagulado. A garota passou a neve recém formada pelo tronco do rapaz sentido alguns ossos fora do lugar, assim como alguns músculos. Não demorou muito pra que ele estivesse limpo, mas o que mais a preocupava era ter que amarrar o peito do jovem comprimindo as costelas trincadas. Ela tentou ser suave mais não teria como e lentamente fitava o rosto do rapaz conforme amarrava as pequenas tiras de pano. 

Quando terminou acendeu a fogueira produzindo algumas faíscas com a pouca mana que lhe restava, cansada demais para usar a perdeneira e o esqueiro, tirou um casaco grande de sua mochila deitou sobre ele feito uma coberta. Isso era tudo que podia fazer além de esperar que acordasse, enquanto perguntas se acumulavam em suas mentes conforme as horas passavam.

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