Capítulo 6

Afundei na banheira para enxaguar o rosto. A água estava morna e Íris havia colocado espuma e pétalas de rosa em meu banho. Eu fiquei impressionada, mas percebi que provavelmente era algo comum para quem morava em um castelo. Estava com a leve impressão de que sentiria falta das coisas simples que tinha em casa. A vida da realeza poderia ser maravilhosa, mas certamente não era perfeita. Pelo menos, não para mim. Tantas coisas com as quais lidar... O reino, o povo, as guerras e invasões, os impostos, as responsabilidades... Era preciso ser muito cauteloso e minucioso. Uma decisão tomada errada, quanto ao que fazer num campo de batalha ou quanto a tentar satisfazer as necessidades de seu povo, poderia colocar tudo a perder.

Saí de meus devaneios quando percebi que ainda estava com a trança de hoje de manhã. A água não havia desfeito o penteado. Passei os dedos no cabelo e, conforme eu desemaranhava os fios, eles ondulavam-se. Lavei-o com um shampoo cheiroso que eu achei ao lado da banheira, e enxaguei. Quando terminei o banho, me levantei e me enrolei na toalha. Abri a porta e quase trombei com Íris, que se preparava para bater.

— Ah, senhorita! — ela exclamou, recuando. — Desculpe, não sabia que havia terminado.

— Tudo bem, Íris. Você precisa de algo no banheiro? — perguntei e saí de seu caminho. Ela se virou de costas para mim e andou até a penteadeira.

— Na verdade, queria avisá-la que o príncipe veio entregar-lhe uma carta. Aqui.

A criada estendeu um pequeno envelope com o meu nome escrito em uma caligrafia redonda. Curiosa, abri a carta e encontrei um pequeno pedaço de papel, onde estava escrito:

Bem vinda ao castelo, senhorita. Ansiosa para me conhecer?

Ass.: J. W. B. Heronwood.

Eu franzi o cenho e olhei para Íris. Por que eu estaria ansiosa para conhecê-lo? E por que seus primeiros nomes estavam abreviados? De repente, algo me ocorreu.

Íris, você sabe quem é o príncipe, certo? — perguntei, tecendo meu raciocínio.

É claro, senhorita. Eu cresci com ele.

E as outras garotas da competição também sabem?

Eu creio que sim, senhorita. Ele foi convidá-las pessoalmente ontem — Íris disse, me olhando como se eu fosse louca ou algo do tipo. A criada se dirigiu ao guarda-roupa e pegou alguma coisa preta que estava ali dentro.

Bom, eu não sei. O homem que foi me convidar na verdade era um guarda. Acho que seu nome era Jonathan.

A garota se virou para mim, arqueando as sobrancelhas, e abafou uma risada. Percebi que a coisa preta enorme que ela segurava era, na verdade, uma capa para um vestido. Provavelmente era novo e precisava de proteção especial. Com ela, tudo o que eu conseguia ver era a barra de uma saia roxa escura. Desviei os olhos da roupa e me concentrei em Íris, que esfregava a testa com uma mão.

O que foi? — eu perguntei, estranhando seu comportamento. — Isso aconteceu apenas comigo?

Íris me olhou e estreitou os olhos, como que tentando decidir se me contaria ou não o que eu queria saber. Por fim, começou a desembrulhar o vestido e o colocou na cama, dizendo, sem me olhar nos olhos:

Eu não tenho permissão para lhe dar essa informação, senhorita, mas você descobrirá dentro de algumas horas, no jantar.

Eu fiquei confusa e estava pronta para perguntar por que ela agia assim, quando algo me tirou o fôlego: a roupa que ela segurava.

Íris ergueu-a em frente a mim, e eu me aproximei. Era o vestido mais lindo que já vira em toda a minha vida, absolutamente digno de uma princesa. Uma fazendeira como eu nunca chegaria perto de algo assim em condições normais. Mas, bem, eu estava no castelo, e coisas caras e bonitas era o que mais se encontravam por aqui.

O vestido era roxo, de renda, e possuía um forro que era de um tecido liso e infinitamente confortável. As mangas longas eram feitas apenas pelo bordado, de modo que parte da pele ficava exposta ao tecido meio transparente. Quando o vesti, ele caiu como uma luva, servindo perfeitamente. Coloquei uma sapatilha, o colar de rubi e virei-me para Íris.

Como sabia meu tamanho? — perguntei, admirada.

Peguei as medidas com a roupa que usava antes — disse, e apontou para o meu vestido azul que estava pendurado na porta do guarda-roupa, solitário. Ela sorriu. — Vamos, não fique aí me encarando. Vá admirar-se.

Fiz o que mandou e andei até a penteadeira, parando em frente ao grande espelho. Fiquei surpresa com o que vi. Realmente havia sido feito para mim, e era tão incrível que me deixava hipnotizada. Eu nunca fui vaidosa e nunca me importei com aparências, mas esse vestido me deixava linda. Ele marcava minhas curvas de modo elegante, e perceptível apenas ao ponto de ser bonito, mas sem chamar a atenção.

Quando finalmente parei de me olhar, Íris pediu-me para sentar no banquinho, e assim eu fiz. Ela começou a pentear meu cabelo, e eu disse que, por hoje, poderia deixá-lo solto. Concordando, a criada apenas desembaraçou-o e deixou-o cair em meus ombros, formando uma cortina ondulada que rodeava meu rosto.

Que tipo de batom você gosta? — perguntou e abriu uma gaveta para olhar o que havia dentro. Inclinei-me e espiei.

Nenhum? — arrisquei e dei um sorriso forçado. Ela me olhou como se visse uma assombração. — Desculpe... Eu não gosto muito de me encher de... coisas. Não é muito a minha cara.

Mas você não gosta porque nunca tentou. Certo? Não faz muito sentido se maquiar para trabalhar.

Na verdade, quando eu era menor, meu pai comprava-me alguns estojos e eu vivia me pintando e fazendo experiências com as cores. Quando cresci, deixei de gostar disso, e parei de ver graça em me arrumar com o propósito de impressionar alguém.

Bom... Se você não gosta, podemos pelo menos começar com um desses? — ela propôs e sorriu, estendendo-me um vidro transparente contendo um líquido rosa claro, pegajoso e brilhante.

Isso é um batom? — perguntei, examinando a coisa.

Bem... Não exatamente. Chama-se gloss, e você usa na boca, mas é líquido. E brilhante. Esse é transparente e bem discreto. Quer testar?

Aceitei e peguei o vidrinho. Abri-o e passei no lábio, olhando no espelho. Minha boca destacou-se com o brilho, mas continuava em sua cor natural. Eu sorri e olhei para Íris, agradecendo. Ela estava pronta para me apresentar mais coisas quando um som veio do corredor, parecido com um grito.

A criada e eu fomos para fora ver o que estava acontecendo. Quando abrimos a porta, nos deparamos com duas meninas brigando em frente a um quarto que possuía sua porta aberta. Elas gritavam uma com a outra e estavam puxando um salto, provavelmente disputando por ele. Pareciam ser garotas da competição, e, no meio da discussão, o cabelo de uma delas, que estava preso em um perfeito coque ornamentado, se desfez. Isso contribuiu para que a raiva entre as duas aumentasse, e elas começaram a se estapear.

Eu aproveitei a chance de escapar e me despedi de Íris, que disse que o jantar seria no salão. Lentamente me afastei da cena, indo em direção à escada. Refiz o caminho que havia me levado até os quartos e consegui, depois de algumas tentativas falhas, encontrar o salão principal. As portas estavam fechadas e os guardas ainda estavam em seus postos. Uma multidão de garotas estava à espera da hora em que finalmente os portões se abririam, nós nos banquetearíamos e conheceríamos o príncipe. Parei ao lado de uma menina loira de olhos negros e perguntei-lhe:

Você sabe por que temos que esperar?

Acho que estão esperando todas as competidoras chegarem — ela disse, após me olhar por alguns segundos.

Havia algo de familiar em seus olhos pretos e sem brilho, mas deixei isso para lá quando ela sorriu e virou-se novamente para frente, pondo-se nas pontas dos pés para tentar observar através da multidão de mulheres.

Qual seu nome? — perguntei, tentando ser gentil. — Eu sou Catherine.

Meu nome é Marian — a loira disse e abriu outro sorriso, dessa vez me encarando por mais tempo. Eu estranhei seu olhar e estava pronta para perguntar o que a interessava, mas algo me interrompeu: as portas do salão estavam se abrindo. As garotas começaram a se empurrar para entrarem e, com isso, acabei ficando para trás, me separando de Marian.

Sem toda a bagunça que havia presenciado antes, pude observar o lugar de modo muito mais claro. O salão tinha um teto alto e abobadado, onde um lustre grande e brilhante se pendurava, formando uma pirâmide de velas e cristais conforme descia, que iluminava todo o ambiente. No centro do local, estava uma mesa longa e larga coberta de comidas e bebidas, assim como pratos, talheres e lindas taças de vidro. Fiz uma nota mental: ficar bem longe das coisas quebráveis daquele lugar. Mais a frente, em um palanque, encontravam-se os tronos reais e mais uma mesa, também cheia de comidas e bebidas. Era um verdadeiro banquete.

Havia cinco tronos, todos pareciam ser feitos de ouro, cobertos com almofadas vermelhas de veludo. O do meio era o maior, e era onde um homem loiro de aparentemente quarenta anos estava sentado. Apesar de não usar coroa em seus cabelos grisalhos, era perceptível que se tratava do rei, pois sua postura dura, séria e fechada denunciava aquilo. Do seu lado esquerdo, estava a condessa Franccesca, que conversava com um garoto um pouco mais velho que eu, o qual possuía cabelos mais escuros que os dela. Apesar disso, deduzi que fosse seu filho. Na direita do rei Stephen, estava o resto da família Heronwood: a rainha — uma mulher da idade de seu esposo, de aparência elegante e gentil, muito diferente do homem com quem casara — e... O príncipe.

O herdeiro do trono estava sorrindo enquanto observava suas possíveis pretendentes disputando lugares para sentarem-se de frente para ele. Seu cabelo loiro rodeava seu rosto, chegando ao pescoço e contrastando com sua pele clara. Ele era parecido com o pai, e, por um momento, achei que minha mente estivesse me pregando peças. Mas, assim que ele levantou os olhos para mim e abriu seu sorriso, não tive dúvidas. Reconheceria aqueles olhos dourados em qualquer lugar, mesmo que só tivesse os visto uma vez.

De repente, senti uma imensa vontade de rir de mim mesma por não ter percebido antes. A carta, a assinatura abreviada, a recusa de Íris de me explicar o assunto, o choque de meu pai ao ver o suposto guarda que viera me convidar para a competição, a estranha sensação que tive de que eles já se conheciam... Estava tão nítido que não percebi.

O príncipe era Jonathan.

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